quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

MARQUITO!!



                                                        “Naquela mesa ele sentava sempre
E me dizia sempre o que é viver melhor
Naquela mesa ele contava histórias
Que hoje na memória eu guardo e sei de cor
Naquela mesa ele juntava gente
E contava contente o que fez de manhã
E nos seus olhos era tanto brilho
Que mais que seu filho
Eu fiquei seu fã”...
(Naquela mesa, de Sérgio Bittencourt)

Mês passado perdemos o Marcos. Ele era o mais velho da nossa turma de Psicologia, o único aluno homem dos formandos de junho/2002. O Marcos era promotor aposentado, fazia Psicologia por hobby, e era o mais engraçado da turma. Não de engraçadinho forçado, ele era naturalmente o mais divertido de todos os tempos.

O Marcos tinha barba grisalha e cara de bravo, mas era pura festa. Por causa desta falsa fachada de cara sério, era ele quem dava trote nos calouros. No 1ºdia de aula, dirigia-se à sala do 1º período de terno cinza e gravata vermelha. Já não havia mais espaço para escrever no quadro e ele falava sem parar pr´aquela sala repleta de recém chegados de mais um rito de passagem, ávidos por conhecimento novo. Era o professor mais formal de Filosofia e dava medo. Era combinado que um de nós, infiltrados ali como repetentes daquela matéria difícil, levantasse seu dedo tímido com a pergunta que não queria calar: Professor Marcos, esta bibliografia já existe em português? E ele, fingindo-se déspota, respondia malvado: Não, só em inglês.

Quem não se lembra das bolinhas de chicletes que ele colava na parede colecionando nossos nomes? Quem não morre de rir lembrando dele desligando o bebedouro pra ficar de longe observando os alunos apertando insistentemente um botão que não saía água, pra depois mandar um bilhete no meio da aula de Psicometria: “ Fui tomar água. Demorei a voltar porque fiz uma experiência interessante. Fechei a torneira do bebedouro e fiquei observando o comportamento dos usuários. Frustração expressa na repetição do aperto do botão. Ninguém se lembrou de abrir a torneira”.

Lembro de uma cena bizarra que ele fazia num repente no meio de alguma aula chata. Ele, sentado lá na frente, virava-se de costas, meio contorcido, numa cena bem exdrúxula, de modo a segurar com os braços cruzados o encosto da cadeira, e virava o olho, numa careta de vesgo que matava a turma do fundão de susto e de riso incontido.

Falar do Marcos é lembrar dos bombons que ele distribuía na sala quando sobravam caixas de chocolate dos churrascos em sua casa azul no Belvedere. Ele também nos presenteava com fotos que tirava da gente em nossos melhores momentos descontraídos, todas com dedicatórias que ele escrevia na hora.

Uma vez ele me disse na cantina: Carol, nunca te vi com outro penteado. Que dia vou ve-la com um corte de cabelo diferente? Realmente, durante muito tempo tive aquele cabelo de mãe-joana, mas o que ele tinha a ver com isso?? O que importa é que tudo que vinha dele era doce. Ele participava de tudo, sabia de tudo, tinha sempre uma opinião e uma solução pra tudo. Até tirar carteira era motivo para bilhetinho: “ ... venho cumprimentá-la pelo sucesso alcançado no teste do Detran... Na oportunidade, ofereço-me, desde logo, como seu passageiro en um eventual passeio. Atenciosamente, seu colega, Marcos.”

Não te vejo, nem te escuto
O meu samba está de luto
Meu violão vai soluçar

(Noel Rosa)

Mesmo há tanto tempo sem vê-lo, por que a morte é sempre tão cruel?
Ficam aí nossas saudades e somente recordações lindas dele.
Marquito!!! Nosso amor por você é unânime, vamos lembrar sempre de você sorrindo.

7 comentários:

  1. Incrível lembranças!Lendo isso tive a incontrolável vontade de colocar no meu currículo, na parte da apresentação: "Amiga do Marcos, do prédio do 12, de Psicologia".
    O quanto aprendi com ele! Depois de um dia cansativo de trabalho e uma dura prova pela frente, quem eu encontrava? O Marcos, já ali na porta, pronto pra me fazer uma cola perfeita e resumida de tudo que ele havia estudado, sempre com seu vocabulário perfeito, suas inevitáveis piadas, observações críticas e acréscimos; que sempre me ajudavam a pensar melhor.
    Hoje tenho um dos melhores presentes dele aqui em casa. O famoso Gudão, que parece entender quando falo que agora o seu "Pai" vai acompanhar todas as suas levadezas.
    Ele, que traz o olhar sério, mas levado, de seu primeiro amigo, Marquito.
    Muitas sds!!!
    Reggys.

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  2. regiane, vc disse tudo! olhar sério, mas levado!! não quis mencionar a parte das colas... xiiii!! sim, guardei todos os bilhetinhos!! não é bom demais?

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  3. Carol, obrigada pelo carinho... lendo suas estórias sobre os "causos" do papai me remeteu a ele quando em vida... amigo, sapeca, conselheiro e encantador... o "coroa" mais lindo que já conheci...
    Muitas saudades dele... e muito amor ainda pra transbordar...
    Mais uma vez, obrigada
    Beijos Leonora Lima.

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  4. Olá carol,
    Eu sou a Laura, a filha segunda do Marcos e agradeço de todo o coração sua homenagem a ele....através de vocês, turma de Psicologia, temos mais dele conosco e agora pelas suas palavras em seu blog, muito dele verdadeiramente com a gente!

    É tão bom saber que papai é amado por tanta gente....porque esse amor é o que ele recebe de onde estiver! e Estas homenagens enchem a gente de emoção...você nem imagina.....

    A saudade aperta muito....mas estou aprendendo a vê-la como a lembrança do papai comigo e quando consigo isso ela me aquece! E já que é assim, saudades dele vou sentir sempre até nos reencontrar.

    Bom, é isso....agradeço de novo pelo seu carinho por ele!

    Bjos
    Laura Lima

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  5. Oi Carol, valeu e muito obrigada por essas lembranças. Deixou saudades. beijos
    Milene Campos

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  6. Vi a homenagem, ficou maravilhosa... Chorei na hora que li o bilhetinho dele pedindo pra você desdobrar a folha...
    Carol, aproveitei e li seu blog (quase) todo, pra ver se pegava um pouco da sua "leveza"... Tô precisando.
    Mel

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  7. nossa, carol, lembro-me do marcos porque ele fez uma supervisão comigo. não sabia de sua morte e lamento muito.
    minha lembrança dele era de uma eduacação sem igual!
    obrigada!
    beijos

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