quinta-feira, 2 de setembro de 2010

la concha de tu madre





o século era quase o XXI, mas quando a filha quis saber o que significava a palavra ‘virgem’, a mãe arregalou o olho e disse rápido: pergunte ao seu pai. na TV passava "O último americano virgem", sessão da tarde. pai, o que é virgem? e a menina teve de ir buscar a resposta no Aurélio. aos 12 anos ficou menstruada. a mãe pediu à empregada que explicasse à menina o significado daquilo, pois causava-lhe tamanho desconforto tratar deste tema, a sexualidade. até hoje Conchita recorda-se da empregada dizendo: você agora está pronta para ter filhos, colega!


e foi sempre assim, o sexo como tabu. um horrendo, nojento e babento bicho-de-sete-cabeças.


a mãe dormia a sesta no cômodo ao lado, e ouvia, caladinha e cínica, a filha adolescente ao telefone. ela combinava com a amiga, sem sequer sonhar que a mãe escutava sua conversa, onde esconder os cigarros que levariam pra festa. não mencionavam a palavra cigarros, então a mãe, do alto de sua mente suja, interpretou que as meninas planejavam levar camisinhas pra festa! xiiii... rendeu!


e falando nisso, mesmo sem nenhuma informação, Conchita perdeu sua virgindade da forma correta: usando camisinha! doeu muito, mas também sentiu muito prazer. dor e prazer eram proporcionais ao tamanho do pecado que cometia, o pecar que ela adoraria bancar dali em diante! o namorado teen ficou com a blusa suja de sangue. era um risco tirá-la pois tinham de agir rápido. estavam na casa dela, na sua cama, posters do Tom Cruise e Rob Lowe na parede bem debaixo do nariz da mãe. esta tinha ido malhar, a empregada via a novela. o menino disse que ia misturar terra com o sangue da blusa, pra então dizer quando chegasse em casa: caí de skate. e ninguém desconfiar daquele ato monstruoso.


quando virou mulher, Conchita enviou uma carta pra Letônia, onde sua irmã fazia intercâmbio. queria compartilhar com ela a alegria daquele rito de passagem. ao mesmo tempo fez promessa que se não ficasse grávida (quanta inocência!) iria a três missas, que foi o maior sacrifício que pensou que pudera fazer naquele momento. no primeiro domingo, o padre discursava sobre a importância da submissão da esposa ao marido. neste dia, pediu perdão a Deus, pois seria absurdo como aquele sermão mais duas doses daquele veneno. nunca mais foi à missa.


o menino era brilhante, nerd não. inventou para aproximar-se dela que queria ajuda nas aulas de história: estarei na sua rua andando de skate e subo pra gente estudar. mas era ela quem descia pra ver suas manobras. os livros ficavam lá sobre a mesa, as páginas virando com o vento. não precisou de mais de duas aulas, já estavam namorando. coisa mais linda, sentavam-se lado a lado na sala de aula: Francisco, el Paco e Concepción, la Conchita.


e lá se foi o hímen da concha de Conchita! a sua pureza e a sua honra.


o tempo corre, a irmã volta com a carta pregada em seu diário, como uma doce recordação que a mãe descobre fácil em seus fuçares frequentes aos diários das filhas. conclui: a filha se perdera. o pai coloca todos os irmãos de castigo, para que sirva de exemplo, que nem a cabeça decapitada de Tiradentes no meio da praça. a caçula chora porque quer ir passear na vizinha, a irmã deflorada defende, o pai faz um comentário pra lá de machista, pra lá de duro, que ela recalca, não se lembra pra contar. a mãe a acorda, quer saber o endereço do menino que a desvirginara. queria ir lá com o marido conversar com seus pais. ia obrigá-los a se casar. tanto o absurdo que a menina desmente: nunca aconteceu nada disso, mamãe, só queria ver sua reação. no rosto emocionado da mãe descem lágrimas, está lívida, abraça a filha contentíssima.


a mãe leva a filha ao médico. a menina mente pra velhota rata de igreja. diz com cara lavada: sou virgem. a bruxa a examina, acha estranho, pergunta de novo, ela afirma de novo: nunca transei. a malvada insiste: você sabe o que é transar? sei. e depois só se lembra da mulher contando-lhe uma história sobre carros que passam na frente de bois.


à noite, em casa, pai, mãe e filhos saem pra comer pizza. o motivo? comemorar!


and the Oscar goes to...




13 comentários:

  1. Carol, que crônica maravilhosa!!! Adorei !!! Vc se superou... Espero sinceramente que seja autobiográfica. Bj

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  2. Carol, adorei!Tem um pouquinho de verdade nessa história, não tem?!

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  3. Hei Carol, joia!?
    É muito bom quando a gente flui de forma espontanea e o passado e a ficção se enlaçam num encontro intenso de significados.
    Bão demais!
    bjo.
    Fidel

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  4. amorecos, Mario Quintana dizia: "Considero indecente toda confissão não transfigurada pela arte.”

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  5. ah! nem acredito!!!! me lembrei da primeira vez em que ouvi a palavra virgem, e adivinha onde foi? tela quente, o último americano virgem!
    minha primeira reação foi perguntar: "o que é virgem?" Escutei da minha irmã: "quem nunca transou, nunca fez amor".
    nossa, que choque! escutei a verdade, como queria, mas não entendi nada!!! hahahaha

    adorei!

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  6. Colina Coralina nos surpreendendo a cada nova crônica... está é simplesmente arretada!!!
    Menina, não lembro de ter perguntado o que significava... tudo era muito além do tabu... uma pena, pois gostaria de ter compartilhado mais! Bjus

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  7. Ahhh!!!! Carolina, como eu gosto de ler suas histórias..... O modo como vc conta é muito legal. Amei aquela que vc conta quando chegou ao Rio. Márcia

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  8. Carol! Na época eu tinha razão, isso merecia um conto. Fico feliz por vc ser a que realiza estórias assim! Eu não poderia ter feito melhor. Saudades menina! Vou te ligar. Bjos guapa

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  9. fabi, tô pasma! que coincidência. a sessão da tarde devia ser a mesma, mesmo dia!! ana, como te falei, lembrei de vc dizendo que queria escrever esta história. ô relaizando seu sonho hahahaha séculos dps. beijos procês todos, mis amores!!

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  10. Carol amei também conhecia parte desta estoria e adorei, no tom de ficção e arte MARAVILHOSO! BJOCAS

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  11. então aquela história "ai, tá doendo, assim não dá, vamos voltar pro tradicinal" é balela??? Afinal de contas, outras percas de virgindade também implicam dor e prazer prporcionais ao tamanho do pecado... rsrsrsrsrs. besitos Carol
    Rafa Benégas

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  12. Carol, demais... ADOREI! E depois você diz que eu escrevo bem! Você é uma escritora!!! Muito bom... Não vi nada de agressivo, é leve, natural... Daria um curta bem legal, taí!!!
    Um beijo e parabéns!

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