Para Coelhinho e Irmã-saltinho:
entediada com a paisagem repetitiva e com o relógio que
caminhava lento, naquele trem ela recordava sua infância num país estrangeiro,
em guerra. guerra esta que ela desconhecia, pela ingenuidade característica da idade. mas de ingênua
não era para outras coisas. naquela época sabia muito bem da maldade de dedurar
as irmãs para a mãe, quando elas por exemplo, faziam arte na escola. tinha duas
irmãs gêmeas que frequentemente se juntavam contra ela e puxavam seu cabelo, seu ponto fraco.
quando ela brigava com uma ou outra, vinha a dupla implacável. o par de monstrinhas
treinava em casa e um dia em sala de aula, uma para defender a outra, puxou o cabelo da
professora até o chão, a qual - para incrementar o grau de crueldade - quase não
tinha cabelo. ela, a irmã mais velha, vendo as gêmeas através da janela do pátio de castigo,
encurraladas na sala da diretora, sorriu mostrando os caninos e chegou em casa
antes da notícia aos ouvidos da mãe. talvez porque tivesse bem vivo dentro de
si um desejo constante de vingança. ou não, fazia-o de pura gaiatice! detalhou
à mãe com detalhes sórdidos a batalha sangrenta das irmãs com a tia Jô, do
emaranhado de cabelos da mestra entre os dedinhos frenéticos da irmã. a mãe atônita
corre à escola deixando a pilha de roupas por passar, trazendo as gêmeas, dependuradas cada uma
de uma orelha por todo percurso do colégio à soleira da porta de casa.
as meninas não choravam, engoliam a seco a dignidade de sua feita e a honra pela
batalha vencida contra a professora déspota. a irmã mais velha se deliciava,
sentada na mesa da cozinha, com a gelatina em cubinhos e o circo de horrores à
sua frente. a mãe que treme pouco, vem descompensada do banheiro onde largara
as demoníacas no banho e agradece à filha mais velha por ter-lhe contado o
ocorrido, enquanto recolhe o copinho raspado de gelatina da mesa. a mais velha, sentindo-se plena, sorriso escancarado na cara, vai para a sala desenhar e espera eufórica pela chegada do pai. num outro
cômodo da casa a mãe termina de passar a roupa ao mesmo tempo que as gêmeas tomam banho de banheira, mudas e penosas de ficar sem sobremesa depois do jantar. é como diz o ditado: um dia da caça, outro do
caçador.
haha adorei! consigo até imaginar vc sentada na cozinha um redondo rostinho infantil, franjinhas angelicais e uma risadinha maquiavelica..hihihi
ResponderExcluir