o século era quase o XXI, mas
quando a filha quis saber o que significava a palavra ‘virgem’, a mãe arregalou
o olho e disse rápido: pergunte ao seu pai. na TV passava "O último americano virgem",
sessão da tarde. pai, o que é virgem? e a menina teve de ir buscar a resposta
no Aurélio. aos 12 anos ficou menstruada. a mãe pediu à empregada que
explicasse à menina o significado daquilo, pois causava-lhe tamanho desconforto
tratar deste tema, a sexualidade. até hoje Conchita recorda-se da empregada
dizendo: você agora está pronta para ter filhos, colega!
e foi sempre assim, o sexo como
tabu. um horrendo, nojento e babento bicho-de-sete-cabeças.
a mãe dormia a sesta no cômodo ao
lado, e ouvia, caladinha e cínica, a filha adolescente ao telefone. ela
combinava com a amiga, sem sequer sonhar que a mãe escutava sua conversa, onde
esconder os cigarros que levariam pra festa. não mencionavam a palavra
cigarros, então a mãe, do alto de sua mente suja, interpretou que as meninas
planejavam levar camisinhas pra festa! xiiii... rendeu!
e falando nisso, mesmo sem
nenhuma informação, Conchita perdeu sua virgindade da forma correta: usando
camisinha! doeu muito, mas também sentiu muito prazer. dor e prazer eram
proporcionais ao tamanho do pecado que cometia, o pecar que ela adoraria
bancar dali em diante! o namorado teen ficou com a blusa suja de sangue.
era um risco tirá-la pois tinham de agir rápido. estavam na casa dela, na sua
cama, posters do Tom Cruise e Rob Lowe na parede bem debaixo do
nariz da mãe. esta tinha ido malhar, a empregada via a novela. o
menino disse que ia misturar terra com o sangue da blusa, pra então dizer
quando chegasse em casa: caí de skate. e ninguém desconfiar daquele ato
monstruoso.
quando virou mulher, Conchita
enviou uma carta pra Letônia, onde sua irmã fazia intercâmbio. queria
compartilhar com ela a alegria daquele rito de passagem. ao mesmo tempo fez
promessa que se não ficasse grávida (quanta inocência!) iria a três
missas, que foi o maior sacrifício que pensou que pudera fazer naquele momento.
no primeiro domingo, o padre discursava sobre a importância da submissão da
esposa ao marido. neste dia, pediu perdão a Deus, pois seria absurdo como
aquele sermão mais duas doses daquele veneno. nunca mais foi à missa.
o menino era brilhante, nerd não. inventou para aproximar-se dela que queria ajuda nas aulas de história: estarei na sua rua andando de skate e subo pra gente estudar. mas era ela quem descia pra ver suas manobras. os livros ficavam lá sobre a mesa, as páginas virando com o vento. não precisou de mais de duas aulas, já estavam namorando. coisa mais linda, sentavam-se lado a lado na sala de aula: Francisco, el Paco e Concepción, la Conchita.
e lá se foi o hímen da concha de
Conchita! a sua pureza e a sua honra.
o tempo corre, a irmã volta com a
carta pregada em seu diário, como uma doce recordação que a mãe descobre fácil
em seus fuçares frequentes aos diários das filhas. conclui: a filha se perdera.
o pai coloca todos os irmãos de castigo, para que sirva de exemplo, que nem a
cabeça decapitada de Tiradentes no meio da praça. a caçula chora porque quer ir
passear na vizinha, a irmã deflorada defende, o pai faz um comentário pra lá de
machista, pra lá de duro, que ela recalca, não se lembra pra contar. a mãe a acorda,
quer saber o endereço do menino que a desvirginara. queria ir lá com o marido
conversar com seus pais. ia obrigá-los a se casar. tanto o absurdo que a menina
desmente: nunca aconteceu nada disso, mamãe, só queria ver sua reação. no rosto
emocionado da mãe descem lágrimas, está lívida, abraça a filha contentíssima.
a mãe leva a filha ao médico. a
menina mente pra velhota rata de igreja. diz com cara lavada: sou virgem. a
bruxa a examina, acha estranho, pergunta de novo, ela afirma de novo: nunca
transei. a malvada insiste: você sabe o que é transar? sei. e depois só se
lembra da mulher contando-lhe uma história sobre carros que passam na frente de
bois.
à noite, em casa, pai, mãe e
filhos saem pra comer pizza. o motivo? comemorar!
and the
Oscar goes to...