quinta-feira, 23 de julho de 2015

Engenho



Acho que não fui uma criança criativa, talvez por ter sido reprovada em todas minhas dúvidas. Coitada da minha mãe, cuidava sozinha, sem babá, empregada ou família, de três meninas. A gente morava na Express Way e meu pai durante a semana trabalhava em outro acampamento, o 215, e só vinha nos finais de semana, que lá no Iraque, eram quinta e sexta. Então, eu imagino que ela não devia ter muita paciência pra ficar explicando miudezas pra gente, pois tinha que lavar, passar, limpar, cozinhar, acompanhar deveres escolares e pentear e higienizar três cocotas, eu e minhas irmãs, de quem ela cuidava como se fôssemos bibelôs. Ela morre de arrependimento até hoje de ter me arrastado pela orelha da cozinha ao banheiro, rangendo os dentes, porque eu não entendi de jeito nenhum o para casa daquele dia, que consistia em ligar a sombra do bicho ao bicho. Já meu pai, por não conviver diariamente, talvez tivesse mais paciência na hora de ajudar nestas tarefas. Numa delas eu tinha que inventar um robô, uma máquina, algo assim. E não tinha a menor ideia. Ele pegou e fez. Se o filho fosse meu eu pensaria junto, mas na época educação era assim, você depositava seu saber na criança que ouvia quieta. E meu pai, engenhoso engenheiro, tão caprichoso e inteligente, criou uma máquina de passar roupa. É engraçado que a tarefa doméstica que eu menos gosto hoje em dia é justo passar roupa. Uma pena eu não ter guardado o desenho feito a lápis, que agora só vive, brilhando a grafite, na minha memória. Daria um caldo!