No começo ficava
vestido dentro de casa: camisa polo, meias, sapato bem lustrado. Uma cerimônia
só! Depois começou a perguntar se podia ficar descalço. Hoje em dia nenhuma
roupa usa e nem se preocupa em fechar as cortinas. Faz café, lê jornal, vê TV,
anda falando ao telefone, come um caqui... Assim como veio ao mundo. Quem
diria, hein, Manolo?
Mabel tinha uma
teoria: todo narigudo é bonito, mas nem todo bonito é narigudo. E assim via o
mundo. Ficava sem chão quando enxergava um narigudo na cantina no intervalo da
faculdade. Faltava-lhe o ar quando no sinal avistava um narigudo no carro
ao lado. E perdia o tino, ai!, quando um narigudo lhe olhava com
luxúria.
Mabel e Manolo hoje
dividem o mesmo teto.
O dia estava azul e
branco quando se conheceram. Na primeira vez que Manolo veio buscar Mabel
em casa, ela, longos cabelos soltos, o esperava na varanda que dava pra
rua. Descia, entrava no carro, ele, nenhum fiozinho de cabelo fora do
lugar, a camisa bem branca e esticada. Ela, um decotaço que ele não
percebeu. Logo no jantar, ele disse: Você parecia a Rapunzel naquela
sacada me esperando. Ela, decepcionadíssima, bem preferia ter escutado: Você
estava uma gostooosa naquela varanda! E na hora do brinde com vinho branco ele
diz: A você, minha princesa! Ela faz xix porque queria ouvir: Gata! Ele
dirigindo na volta pra casa passa num buraco e Mabel pensa ranzinza: Ô roda-dura!
E toma um susto, bom, porque ele pega na perna dela, mas joga
tudo no ralo quando docemente pergunta-lhe, olhando lá no fundo dos seus olhos:
Você está bem, princesa? Mabel, desiludida, bem gostaria que ele
esbravejasse: Caralhooo!! Essa prefeitura de merda que não conserta a porra
desses buracos!!!
Manolo tinha uma
forma suave de falar, um jeito lento de se mover, uma maneira muito cuidadosa
de mexer nas coisas. Se fosse de vidro não quebraria nunca. Mas tinha o nariz
grande, uns 30 gramas de nariz. Mabel, acima de tudo, só enxergava aquele
narigão que botava qualquer titubeio no chinelo. Manolo era narigudo e logo,
bonito de morrer!
Numa festa a lua
estava cheia. Mabel comentou, que linda a lua. Manolo disse: É nossa! Foco,
Mabel, foco no nariz! Manolo era menino criado por vó, e por isso, ingênuo e puro
- consolava-se a pobre. Era ver pra crer!
Despedindo-se no
carro ela ansiou por uns amassos, queria ouvi-lo dizer: Vou te sequestrar!
Mas ele lhe deu um beijo insosso na boca e perguntou: Posso arrancar um
pedaço, pôr no formol e deixar ao lado da minha cama? E pra piorar deu-lhe boa
noite com um beijo na mão. Mabel subiu as escadas enfurecida e antes que
fosse preciso interná-la em camisa de força, prometeu que aquela seria a
última vez, a última, entendeu?
Mas quando fechou a
porta do quarto e viu dependurada a caricatura do namorado feita naquele evento
de quadrinhos, o narigão sobressalente, teve sonhos eróticos com Manolo
e esqueceu de tudo.
Numa reunião
de amigos, cada casal disse qual parte do corpo de seu companheiro gostava
mais. Manolo disse: As mãos de Mabel. Ela não aguentou: Poxa, eu ralo malhando
a coxa na academia! Neste dia ele se animou, pegou na perna dela, ela gostou,
queria que ele agora pegasse na sua bunda, mas ele fez uma pausa pra dizer: Parecemos
duas crianças nos descobrindo. Fon fon!
Era impossível,
basta! - ela disse. Continuar com ele era como “querer transformar em azul o
mar vermelho” (frase bonita do Amos Oz)! Então no rádio do carro começou um reggae e
Manolo cantarolou: I wanna love you and treat you right I wanna love
you every day and every night. Apontou o nariz pra ela e os dois cantaram
juntos o refrão: is this love is this love is this love that i´m
feeling?
mulheres... é impossível sempre acertar nos agrados...
ResponderExcluirBenegas
hahahahahahahaha...
ResponderExcluirNarigudo criado com Vó!
Este era para morrer solteiro, mas tem doida pra tudo. Ou para cada pé torno um chinelo velho!
Adorei, tô rindo até agora!
Bjo,
Fidel
Carol vc é genial!!!
ResponderExcluirSempre amo!!
Bom sobremaneira colina!
ResponderExcluirCoralina:
ResponderExcluirde tudo um pouco, Almodóvar, Lavoisier, Bob Marley, você. E uma forma alternativa de amar.
Muitas risadas,
Flávia (pós)
flávia, vc falou em formas alternativas de amar... lembrei que freud vê o fetiche como uma forma pervertida (e não, perversa) de amar. muito bom, né!? "contra gustos no hay disputas".
ResponderExcluirWell, that was really cool. I ain't got no more words, but It made me miss you even more. I wanna see again your little lovely nose, Colina Coralina.
ResponderExcluirahahahaha...muito bom. Beijos, Bel beleleo.
ResponderExcluirCarol, só agora vi este. Que engraçado, dei gargalhadas muito altas no trabalho. O desfecho com Viva Bob Marley foi tétrico!!! Muito engraçado mesmo, do começo ao fim. Um beijinho, Rê.
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